Entre fãs e haters: a reação do público brasileiro ao sucesso internacional da cantora Anitta

Andreza Felix, Daniela Amorim, Letícia Livramento, Silvani Maciel e Vivian Oliveira


Com um extenso engajamento nas redes sociais e um marketing pessoal que envolve desde finanças até áreas sociais, a cantora Anitta alcançou um grande público dentro do Brasil. Após a consolidação de sua carreira no país, a artista decidiu se aventurar para além da fronteira, com a ajuda dos fãs. Desde então, seus seguidores têm se dividido entre apoiar e criticar a novidade.

Defensores da cantora afirmam que a carreira internacional de Anitta pode levar um pouco da cultura brasileira para o restante do mundo. Aqueles que a acusam consideram que, quando o objetivo dela era o Brasil, ela sempre foi criticada pela sexualização de suas letras e clipes que podem servir de "validação" para o estereótipo da brasileira: carnaval, futebol, favela e bunda. E como diferentes versões de uma mesma história, podemos observar como os fãs e haters constróem seus argumentos de apoio e/ou críticas.

A interação digital entre Anitta e seus fãs

A carreira de Anitta vem sendo desenhada e desenvolvendo-se a cada trabalho minuciosamente pensado. É notório que o mesmo acontece em sua relação com os fãs. O papel deles na caminhada artística dela é de extrema importância, principalmente ao falarmos de engajamento, divulgação etc. A aproximação que ela mantém com seu público no Twitter, por exemplo, é de chamar atenção.

Com o lançamento da faixa “Envolver”, em novembro de 2021, Anitta conseguiu alcançar altos números de visualizações. Quando a música chegou ao segundo lugar no Top Global no Spotify, seus fãs brasileiros viram a chance de levar a música ao topo do mundo.

Um grupo de fãs propôs uma série de desafios, que passaram por oito cidades do país. O “Envolver Challenge” tornou-se viral principalmente no TikTok, e mobilizou até celebridades. Neymar, por exemplo, foi um dos vários famosos que entraram na onda. Os vídeos mostram pessoas fazendo a coreografia da música em vários lugares, como ruas, metrô e praias. O desafio foi compartilhado no perfil oficial da Central de Fãs da cantora e chegou a mais de 1 bilhão de visualizações.

Além dessa ação, os internautas usaram o Twitter para elevar o nome de Anitta e da canção, comemorando cada avanço com memes e publicações, ampliando sua visibilidade cada vez mais. Também se organizaram para ouvir a música no YouTube e no Spotify a maior quantidade de vezes possível. Finalmente, em 25 de março de 2022, Envolver foi a música mais ouvida no mundo nas últimas 24 horas no Spotify, com 6,39 milhões de reproduções. Na mesma data, o clipe alcançou 73 milhões de visualizações e ficou em 8º lugar entre os vídeos Em Alta do YouTube.

Com isso, ficou nítido que Anitta tem um verdadeiro exército de fãs que se comprometem com ela. Ela pode contar com eles não só apenas em relação à sua carreira artística musical, mas também em relação a causas que a cantora defende, tornando-a uma personalidade muito influente no meio artístico. Um exemplo dessa força de interação da cantora com o público foi a campanha organizada por alguns artistas nas redes sociais para que jovens de até 17 anos tirassem o título de eleitor, em março de 2022. Anitta foi uma das principais protagonistas da campanha, articulando-se até com estrelas internacionais para oferecerem seu apoio. Surtiu efeito: segundo o TSE, 2 milhões de jovens tiraram o título de eleitor, um crescimento de 47,2% em relação ao mesmo período de 2018.


Segundo Bennet (2012), o ativismo de fãs tem relação com a sensação de proximidade mantida entre o fã e a celebridade, o que se intensifica mais ainda nas mídias sociais. Esses ambientes favorecem um sentimento de intimidade, pelo qual os fãs sentem que têm acesso ao “eu” autêntico da estrela. Também é por meio das plataformas da mídia social que uma cultura de fãs, em todas as suas redes e comunidades interconectadas, pode ser rapidamente reunida, trabalhando de modo coordenada para atingir um objetivo comum. O bom uso dessas ferramentas por parte de Anitta tem sido fundamental para a consolidação dessa base fiel de fãs.

Como a carreira internacional de Anitta mexeu com o fandom

Lançado em 2017, o EP "Checkmate" prometeu inovar e conseguiu trazer algo nunca antes visto em estratégias musicais brasileiras. Anitta realizou ações em pontos de grandes cidades por todo Brasil com o objetivo de impulsionar o lançamento de quatro singles. O que muitos não esperavam é que esse seria o primeiro grande passo de Anitta a caminho de sua carreira internacional. O EP contou com duas músicas em língua inglesa, uma em espanhol e apenas uma em português, o que surpreendeu o seu público.

A primeira incursão da cantora em idioma estrangeiro havia sido o hit “Paradinha”, cujo videoclipe foi visualizado 6,4 milhões de vezes nas primeiras 24 horas, quebrando o recorde brasileiro. Apesar do grande sucesso da música, este também foi o primeiro momento em que a artista foi acusada de ter se rendido à cultura “gringa”. Com o lançamento de “Checkmate”, essa reação veio em dobro. Ao lado de muito sucesso e grande aclamação de um novo grande público para Anitta, vieram também muitas críticas em relação à responsabilidade da cantora como uma artista brasileira. Deveria Anitta fazer sua carreira internacional apenas cantando músicas no idioma dos outros países?

Sobre os riscos de sua investida no mercado internacional, o jornalista Reinaldo Glioche, por exemplo, diz: “É natural um artista abraçar beats mais comerciais quando decide avançar sobre o desconhecido e Anitta sempre mostrou ter uma boa engenharia de carreira, mas vive um momento de definição. Fracassar em seu projeto de virar uma estrela internacional seria trazer esse fracasso de volta para seu dia a dia como popstar brasileira. Pode ser um revés tão irreversível quanto o status que ela goza agora e almeja mudar drasticamente.”

Apesar de todo contraste nos comentários e reação do público, “Checkmate” revolucionou a maneira com que a promoção da cantora era vista.

Em 2022, a expectativa para o primeiro álbum internacional da cantora, em parceria com a Warner Records, era grande. Num primeiro momento, Anitta divulgou que o projeto seria intitulado Girl From Rio, mas em março, menos de duas semanas antes do lançamento, anunciou a mudança do nome do álbum para Versions of Me. A troca de nome e a divulgação da arte de capa dividiu opiniões. Nas redes sociais, foram inúmeros memes (tanto de apoio como de crítica) à decisão da artista, que se perguntavam sobre os rumos da sua carreira internacional.



Quando Versions of me saiu, com 15 faixas em inglês em espanhol, e apenas uma em português (“Que Rabão!”), uma parte dos seus fãs afastou-se. A sensação de que a artista estava abandonando seu público nativo, deixando de lado suas raízes brasileiras, além de questionamentos sobre que tipo de imagem do Brasil estava sendo projetada para o resto do mundo, rendeu críticas e discussões vistas até hoje nas redes sociais digitais. Dessa forma, é perceptível que o investimento de Anitta em chegar a outros mercados dividiu seu próprio fandom.

O lado positivo: a aceitação da internacionalização da imagem de Anitta

Após a movimentação do público brasileiro para dar play em Envolver, música que levaria a artista para o topo do Spotify global, Anitta declarou “nunca ter visto o Brasil tão unido”. O sucesso da cantora e o seu reconhecimento no cenário mundial também reflete-se no sentimento dos seus fãs. O Brasil ainda não havia exportado uma cantora pop - menos ainda uma que explorasse ritmos tipicamente brasileiros, como o funk. Para muitos, como o jornalista Chico Barney, o sucesso de Anitta, portanto, trouxe motivo para ter “orgulho de ser brasileiro” (UOL, 2017).

Em sua aparição no festival de música Coachella, um dos mais relevantes do mundo, Anitta chamou atenção do público e da imprensa internacional. Com uma performance repleta de verde, amarelo e azul, ela levou o cenário das favelas do Rio de Janeiro e a essência do baile funk para onde os holofotes mundiais estavam apontados. Foi assim que ela conseguiu se tornar um dos assuntos mais comentados do evento que, mesmo tendo sido nos Estados Unidos, conseguiu captar a atenção dos brasileiros (GZH música, 2022).

O show contou com hits de todas as épocas da cantora, e inclusive com um cover de Garota de Ipanema. No Twitter, sua apresentação foi comparada à de Beyoncé, em 2018, e não só por fãs brasileiros. A hashtag #Anichella (Anitta + Coachella) entrou para os Trending Topics do Twitter, com alguns fãs comparando ao termo “Beychella”, quando Beyoncé se apresentou como a primeira mulher negra headliner do festival.


Assim, não restam dúvidas que ela vem abrindo portas para o funk mundo afora. Em uma apresentação no Lollapalooza Brasil, ao lado de Jack Harlow, o rapper brasileiro L7nnon não poupou elogios e agradecimentos à artista pelos últimos acontecimentos, que acabam dando visibilidade e abrindo oportunidades para outros artistas nacionais trilharem pelo mesmo caminho. Apesar dos haters, a nova fase de Anitta trouxe para seus fãs o orgulho de ter sua cultura reconhecida e uma parte dela alcançando lugares jamais acessados anteriormente.

Referências

ALMEIDA, C.; CAVALCANTI, G. Fãs, representação e ativismo: shipping de casais homoafetivos na teledramaturgia da Rede Globo. Revista Ícone, v. 16, n. 1, p. 100–119, 2018. Disponível em: <https://bit.ly/3dE3pnv>. Acesso em: 17 ago. 2022.

ANITTA anuncia mudança de nome do novo álbum e imagem da capa divide os fãs nas redes. GZH música, Online, 2022. Disponível em: <https://bit.ly/3R9aFGP>. Acesso em: 17 ago. 2022.

ANITTA relembra medo de falhar no início da carreira internacional: 'Não queria me tornar uma piada' GSHOW, Online, 2022. Disponível em: <https://gshow.globo.com/tudo-mais/tv-e-famosos/noticia/anitta-estampa-a-capa-da-revista-billboard.ghtml>. Acesso em: 17 ago. 2022.

BARNEY, C Anitta é motivo para ter orgulho de ser brasileiro. UOL, Online, 2017. Disponível em: <https://entretenimento.uol.com.br/colunas/chico-barney/2017/05/02/anitta-e-motivo-para-ter-orgulho-de-ser-brasileiro.htm>. Acesso em: 17 ago. 2022.

BENNETT, L. Tracing Textual Poachers: reflections on the development of fan studies and digital fandom. Journal of Fandom Studies, v. 2, n. 1, p. 5-20, 2014. Disponível em: <http://williamwolff.org/wp-content/uploads/2015/01/lbennett_1-libre.pdf>. Acesso em: 26 mai. 2021.

0 Comentários