Reflexos de uma nova era: a GloboNews inserida na cultura participativa

Inserido nos dias de hoje, em meio a uma cultura participativa, o maior canal de telejornalismo brasileiro, GloboNews, sofre influências, consequências e procura se adaptar em meio às mudanças de perfil de seus assinantes. Por causa da internet e das novidades na comunicação, agora há um forte poder de influência do telespectador sobre algumas decisões da emissora, além de incorporações de memes e webcelebridades em seus jornais para maior propagação na internet. Quer entender mais? Taí, então entra que já vai começar.


 A Cultura Participativa na Televisão e a GloboNews

É 2021 e a televisão brasileira não é mais a mesma. De 1950 até hoje, muitas estruturas e meios de comunicação evoluíram, certas linguagens e formas de abordagem mudaram e, consequentemente, o modo de consumo dos telespectadores também. Este último, principalmente, graças ao surgimento das novas redes sociais e da difusão da internet e dos aparelhos eletrônicos. Como esperado, essas novas configurações também recaíram sobre o telejornalismo brasileiro.

O termo “cultura participativa”, cunhado por Henry Jenkins (2008), teve seu início em um estudo sobre a produção cultural e as interações sociais de comunidades de fãs, no entanto esse conceito evoluiu e em Cultura da Conexão (2014), os autores repensam esse termo, que agora se refere a uma forma ainda mais ampla de como toda a audiência recebe, assimila e produz conteúdos. Outrora, os telespectadores eram vistos como seres passivos que somente assistiam a mídia televisiva e absorviam seus conteúdos, já nessa nova configuração os espectadores buscam fazer as suas próprias produções culturais e demandam, cada vez mais, participação e interatividade sobre o que consomem.

Conforme o conceito foi evoluindo, acabou se referindo, atualmente, a uma variedade de grupos que funcionam na produção e na distribuição de mídia para atender a seus interesses coletivos, de modo que diversos especialistas interligaram suas análises do fandom num discurso mais abrangente sobre a participação na mídia e por meio dela. (JENKINS et al, 2014, p.20)

Por muitas vezes, mesmo com grandes resultados comprovados de audiência e investimentos massivos em ambientes participativos [1] acontecendo no entorno, muitos shows televisivos e muitas emissoras continuam ignorando esse potencial. No jornalismo, isso é ainda mais comum e a inovação ocorre mais lentamente do que em outros setores, seja por princípios éticos da profissão, conceitos atrasados de seriedade ou preocupações com uma “linguagem neutra”. Talvez esse não seja o caso da GloboNews.

GloboNews é um canal de televisão por assinatura que transmite uma programação jornalística 24 horas por dia. Desde sua estreia, em 1996, eles nunca desligaram e apostam em um jornalismo diferenciado, dinâmico e prático - chamado de padrão CNN [2], por Maria Beltrão. Ao longo de sua programação sempre existiram jornais “mais sérios”, como é o caso do Jornal das 22h e da Edição das 0H, quanto jornais “mais leves”, como é a Edição das 10h, e outros ainda mais fora do formato tradicional como é o caso do “Estúdio I” e do “Em Pauta”. A grade de programação, apesar de focar no noticiário, também possui - ou pelo menos possuia até antes da pandemia do covid-19 - shows, entrevistas com artistas e participações especiais. Na contramão de um jornalismo muito engessado, os âncoras e repórteres da GloboNews sempre puderam explorar uma proximidade maior com o seu público. Não é atoa que a constante busca por mudanças e renovações colaboram para que o canal seja o líder de audiência em seu segmento, chegando a ter até três vezes mais audiência do que seu principal concorrente, a recém fundada CNN Brasil.

Maria Beltrão, Marcelo Cosme, Aline Midlej são alguns dos grandes nomes de âncoras da emissora. Eles comandam, respectivamente, os programas de sucesso Estúdio I, Em Pauta e J10, e já participaram de alguns episódios que podem exemplificar a cultura participativa causando na GloboNews.

Estúdio I: a incorporação de memes e webcelebridades no jornal

“O programa jornalístico de entrevistas, debates e comentários procura mesclar informalidade e informação [...] Cantores e bandas também marcam presença, divulgando sua música e novos trabalhos.”, é assim que o Estúdio I (GloboNews, 2008-presente) é definido em sua página do Wikipedia. Nele, um fenômeno recorrente acontece; celebridades da internet e memes virais estão se tornando frequentes no programa e podemos enxergar isso claramente com as participações recentes de Esse Menino, autor do vídeo viral conhecido como “vídeo da pê-fáizer”, e de Alice, um bebê que viralizou no TikTok e no Twitter por conseguir falar palavras difíceis.


A incorporação de sucessos da web é natural, dado o mundo em que vivemos, mas o Estúdio I faz isso com excelência. Atrair o público da internet, instigar a produção de memes e a propagação de conteúdos nas redes sociais são ótimas formas de se divulgar um programa de TV hoje em dia. Aproveitar o timing certo de quando algo está em alta, trending, é essencial para que o buzz seja aproveitado por ambos - tanto para TV quanto para a personalidade da internet.

Um dia após a viralização (quase) instantânea e natural do “vídeo da pê-fáizer”, os jornalistas da GloboNews não hesitaram em comentar sobre o mesmo na Edição das 10h, no Estúdio I e, também, no Em Pauta. No programa de Maria Beltrão, além de citar e comentar o vídeo que viralizou na web, eles ainda exibiram um vídeo exclusivo feito pelo Esse Menino, que brincava com os comentaristas e fazia graças a cada um. Isso sim é uma incorporação de sucesso.

Outro episódio recente foi a entrevista de Alice. O bebê viralizou nas redes e na mesma semana lá estava no Estúdio I, juntamente de seus pais, dando uma entrevista fofa para Maria Beltrão. Diversos trechos se tornaram memes, o que gerou várias pílulas para serem compartilhadas nas redes sociais. No blog de Hugo Gloss é possível ver alguns vídeos e comentários dos telespectadores: “Fofura! Maria Beltrão fica no "vácuo" ao tentar conversar com Alice, a bebê que repete palavras difíceis.”

Em Pauta: o poder de influência do público e a reversão do cancelamento

Em 2 de junho de 2020, uma quinta-feira, o programa Em Pauta foi ao ar e discutiu o tema racismo no Brasil. O problema? Não havia nenhum jornalista negro integrando a equipe para falar de um problema que afeta justamente a população negra. Como esperado, o acontecimento repercutiu nas redes e algumas pessoas negativaram a atitude do canal. Um único tuíte ironizando o programa chegou a alcançar 21,7 mil curtidas e mais de 3.000 compartilhamentos no twitter.


Em meio à repercussão e à possibilidade de cancelamento, o canal respondeu rapidamente e realizou um programa inédito no dia seguinte; um Em Pauta inteiramente composto por apresentadores, jornalistas e comentaristas negros - discutindo o tema racismo e compartilhando relatos. Um sucesso para a crítica. “Emocionante”, diz matéria sobre o episódio no jornal O Tempo.

Não entraremos na discussão ética ou moral do acontecido, portanto ao se analisar o fenômeno comunicacional é possível perceber como a internet e as novas configurações viabilizaram esse ocorrido. As redes sociais e os internautas não teriam esse poder sozinhos se não fosse uma cultura inteira sendo construída em torno da participação da audiência nos conteúdos consumidos. O público anseia por ser ouvido cada vez mais. E nesse caso, também vemos a importância da troca de informação e das reflexões que os novos fluxos comunicacionais trazem à sociedade.

Ficamos por aqui.

Além de programas de entretenimento e seriados ficcionais, a cultura participativa se faz presente em diversos outros tipos de mídia e, agora, também se faz no jornalismo. É curioso vermos a participação do público como estratégias de marketing em telejornais brasileiros, mas a tendência é isso se tornar cada vez mais comum - principalmente no estilo GloboNews de jornalismo.


Notas

[1] Existem cases de sucesso que instigam a participação do público e fazem com que um programa de televisão se propague mais rápido. Exemplos: The Masked Singer, Big Brother Brasil e a própria emissora GloboNews.

[2] CNN é um canal estadunidense de jornalismo, o primeiro de cobertura jornalística 24 horas.

Referências

Após polêmica, GloboNews escala profissionais negros para debater racismo no Em Pauta. F5, Online, 2020. Disponível em: <https://f5.folha.uol.com.br/televisao/2020/06/apos-polemica-globonews-escala-profissionais-negros-para-debater-racismo-no-em-pauta.shtml>. Acesso em: 21 ago. 2021.

DOS SANTOS, M C. Existe jornalismo transmídia? Considerações sobre o reúso de conceitos. Revista GEMInIS, v. 8, n. 3, p.136-149, 2017. Disponível em: <https://www.revistageminis.ufscar.br/index.php/geminis/article/view/308>. Acesso em: 21 ago. 2021.

Globo News Em Pauta tem edição histórica e emocionante só com jornalistas negros. O Tempo, Online, 20200. Disponível em: <https://www.otempo.com.br/brasil/globo-news-em-pauta-tem-edicao-historica-e-emocionante-so-com-jornalistas-negros-1.2345574>. Acesso em: 21 ago. 2021.

JENKINS, H. Cultura da convergência. São Paulo: Aleph, 2008.

JENKINS, H. et al. Cultura da Conexão - Criando Valor e Significado por Meio da Mídia Propagável. São Paulo: Aleph, 2014.

MORGADO, F. Brasil: 70 anos de TV, 70 anos de telejornalismo. Comuniqui-se, Online, 2020. Disponível em: <https://portal.comunique-se.com.br/brasil-70-anos-de-tv-e-telejornalismo/>. Acesso em: 21 ago. 2021.



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