Webcomics e o valor do fã

As histórias em quadrinhos (ou HQs) influenciaram diversos movimentos e produções no âmbito da cultura pop. Ao longo do tempo o seu formato e suas narrativas foram expandidos à medida que novas ferramentas, espaços e funções sociais foram surgindo. Neste contexto, o ambiente de convergência foi fundamental para que os quadrinhos fossem renovados, imbricados por culturas e movimentos de fandoms, fortalecendo marcas e personagens emblemáticos, assim como o surgimento de novos artistas, autores e criadores e plataformas de distribuição e acesso. 

Figura 1 - Gif feito pelo artista e fã @fitsfito, da webcomic Arlindo, de @ilustralu 

O papel do prosumer na era digital 

No ambiente de convergência as relações se caracterizam pelas novas possibilidades tecnológicas que a rede oferece e por ondas sociais e sociológicas que se impulsionam e se organizam em diferentes quadros (JENKINS et al, 2015). Dentre elas, destacam-se a inteligência coletiva e a cultura participativa. Jenkins et al (2015) discute os termos em seus estudos sobre a cultura de fãs e a relação prosumers — na qual os consumidores tomam papéis ativos e críticos sobre os produtos de seus interesses e invertem seus papéis tornando-se, também, produtores de conteúdo. 

Para definir os consumidores desses inúmeros conteúdos e narrativas, McCracken (2013) aponta o termo “multiplicadores” como uma alternativa, reconhecendo as formas pelas quais esses grupos e indivíduos geram valores por meio de seus movimentos. A partir desse ponto enxerga-se o multiplicador como um indivíduo que “[…] trará o produto, o serviço ou a experiência como um ponto de partida” (MCCRACKEN, 2015, Online apud JENKINS et al, 2015, p. 330) 

Artistas também encontraram no ambiente de convergência espaços para publicar suas criações e para usufruir de novas ferramentas e interações com o público. Assim os multiplicadores aplicam nesse espaço o desdobramento não-canônico de mídias já existentes e ainda encontram portas para suas criações originais. Nesse ambiente que implica em socializações, admirações e ágeis trocas de informações, prosumers encontram os valores afetivos, sociais, e, fundamentalmente para suas manutenções: o valor econômico. 

Crowdfunding e o valor econômico do fã 

No estudo da cultura de fãs entende-se por “fãs” um grupo de indivíduos que agem ora sozinhos ora coletivamente (fandom) em prol de um objetivo em comum, relacionados a personalidades, produtos, serviços ou ideias (JENKINS et al, 2015). Se envolvendo intelectualmente e emocionalmente. Obviamente, dentro desses agrupamentos existem diversas ramificações que os distinguem como, por exemplo, personagens preferidos, shipping, e até mesmo ideologia e valores sociais e políticos. O ponto é, na mercantilização desse algo em comum, os fãs são acompanhados de um valor econômico capaz de decidir a manutenção e o próprio valor do produto. 

Exemplo disso são as diversas fanarts que se tornam desdobramento de relacionamento de personagens não explorados na narrativa canônica. Durante a exibição da série A Lenda de Korra, no canal infantil Nickelodeon, um dos casais mais aclamado pelo público e pela própria produção foi o relacionamento homoafetivo de Korra e Asami. Devido a faixa etária do canal e visões conservadoras sobre o público, o arco romântico não foi explorado, sendo possibilitado apenas quando a mídia se desdobrou para as HQs, se tornando uma trama canônica. 

Figura 2 - Fanarte feita pela fã e artista @pockicchi do ship Korrasami da animação "A Lenda de Korra". 

Na mídia independente, os produtores encontram na internet espaços além da divulgação de seus trabalhos, plataformas em que suas criações são publicadas, fazem parte ou são as próprias plataformas. Dito isso, como um produtor independente encontra na internet uma fonte para manutenção de suas criações e lucro pessoal? E ainda, como a exposição e o compartilhamento gratuito de suas obras são fontes desses valores? 

Stribling (2013) realiza uma análise do comportamento de fãs que contribuem com o valor econômico e os categoriza em quatro tipos de atividades, sendo essas divididas em dois âmbitos. O primeiro abrange o comportamento que fornece um valor direto: “assistindo, ouvindo ou participando” e “comprando produtos primários e secundários”. Dentro desse espectro o fã gera engajamentos e visualizações, dando uma visibilidade direta e contribuindo economicamente ao produto e produtor, possibilitando sua manutenção. O segundo âmbito é referente ao valor indireto: “endossando” e “compartilhando e recomendando”, que, apesar de serem mais difíceis de quantificar, contribuem valiosamente aos “elementos sociais que ajudam tanto a reter como recrutar público”, segundo a autora. 

Uma vez que Jenkins et al (2015) utilizam as categorizações de Stribling (2013) ao analisar e discutir o papel do fandom nas produções televisivas (utilizando da audiência e do streaming como parâmetros de valores do engajamento), torna-se fácil visualizar esses mesmos valores na mídia independente. Ao contrário dos grandes serviços de streaming e das emissoras, os produtores independentes agem na maioria das vezes sozinhos, e a busca por um público de nicho que se fidelize às suas criações é essencial para a manutenção de seu trabalho. Afinal, os gastos vão além do custo de produção, mas ao lucro pessoal também. 

A circulação de mídia independente “[…] normalmente demanda mecanismos participativos para compensar a falta de orçamento promocional” (JENKINS et al, 2015, p. 321). Stribling reconhece essa mesma possibilidade ao destacar que o equilíbrio dessas produções e mediações “[…] pode se deslocar para uma modalidade de mídia ao longo do tempo quando for sustentada por fãs dedicados […]” (2015, Online apud JENKINS et al, 2015, p. 180). A segunda forma-chave é “considerar como o tempo afeta o valor das expressões”, e isso é analisar e compreender como o comportamento dos fãs vão se alterando ao longo do tempo. Afinal, dados como número de fãs ou seguidores nas redes sociais “[…] não indicam o que esses fãs fazem, uma vez que eles fizeram amizade ou seguiram o propósito de participar, promover ou apoiar a modalidade de mídia” (JENKINS et al, 2015, p. 180). 

A assertividade da criação de públicos nichos é originada, principalmente, através do compartilhamento e da recomendação pelos indivíduos que consomem o produto. Essa lógica parte da perspectiva de que um indivíduo que gostar de determinado produto, fará parte de uma bolha social que, possivelmente, terá gostos semelhantes. 

O crowdfunding ou simplesmente financiamento coletivo surge como uma opção que se popularizou entre artistas e produtores na mídia independente. A interação se popularizou através de plataformas e redes específicas (Catarse, Vakinha e etc) para a prática popularmente conhecida como vaquinha. O termo em inglês se caracteriza como um financiamento coletivo que 

[…] conecta diretamente, por meio da Internet e das mídias sociais, as pessoas que podem doar, emprestar ou investir dinheiro com aquelas que necessitam deste dinheiro para financiar um projeto ou negócio que desejam realizar, através de pequenas contribuições de um grande número de indivíduos, que juntos, de forma anônima, formam a massa crítica para viabilizá-los (MARTINS; DA SILVA, 2014, p. 26). 

Figura 3 - Página inicial do site Catarse (Acesso: 22/05/2020) 

Martins e Da Silva (2014) categorizam os vários tipos de financiamentos coletivos, que vão desde doações, recompensas e empréstimos a divisão dos lucros e participações. Cada tipo de crowdfunding se caracteriza por diferentes interesses, como social, material e financeiro. É preciso destacar que os modelos de vaquinha dependem dos tipos de projetos para melhor eficácia. Para a adesão dessa forma de contribuição econômica, o valor do fã e de um público fidelizado, o público nicho é um diferencial. Isso porque acreditam e/ou estão ligados de forma crítica, ativista ou afetiva com os projetos e por sua manutenção a fim de apoiá-los. 

Nas formas de financiamento coletivo mais populares no site Catarse para projetos de mídia independente, se destacam doações, recompensas e participações. Como resultado, os financiadores podem ser recompensados com nomes nos agradecimentos do projeto, brindes que variam dependendo do valor até participações especiais (como em caso de produções audiovisuais). 

Figura 4 - Projetos de Webcomics disponíveis para financiamento coletivo no site Catarse (Acesso: 22/05/2020) 

Os quadrinhos reinventados 

Tanto quanto o comportamento do fandom quanto a produção das narrativas ilustradas encontraram na internet um espaço de mudanças constantes: a forma como um fã consegue se agrupar com outro grupo de pessoas de mesmos propósitos, endossando discussões de arcos e lacunas das histórias, o contato do público e dos produtores, espaço para o surgimento de novos criadores e novas ferramentas e experimentações da mídia. 

Jamison (2017, p. 26) destaca que “Esta novidade tem a ver com tecnologia, velocidade, formato e as convenções e formas que estas mudanças permitem”. Assim como é possível observar em outras produções, inclusive na mainstream, o espaço de convergência possibilitou que novos modos de narrativas e expressões fossem utilizados de maneira funcional, que o formato convencional não permitia ou pelo público massivo, ou pelas funções técnicas. A utilização desses modelos de experimentações, potencializada ou apenas permitida pela tecnologia, é diretamente ligada pela forma sociológica da qual ela é utilizada. Entretanto, é uma via de mão dupla: se novas experimentações são permitidas porque surgem aparelhamento tecnológico, o desenvolvimento dessas tecnologias se deve porque há demanda social. É um processo simultâneo, o que deve ser considerado são as formas como o público subverte e traz novas funções a essas ferramentas. 

A demanda por interações no ambiente virtual, tanto com outros usuários quanto com as próprias tecnologias e suas ferramentas, acrescenta-se a outro propósito. Elas “[…] permitem que novos e diferentes tipos de histórias sejam contadas — e lidas — por diferentes tipos de pessoas” (JAMISON, 2017, p. 32). Reunindo todas as possibilidades de contar novas histórias e inovar esses modelos, a web se posiciona 

“[…] como um espaço mais aberto para que novatos provassem seu valor como artistas, assim como uma tecnologia que poderia ampliar o público potencial de histórias em quadrinhos ao permitir que escritores e artistas explorassem temas que nunca se tornariam publicações no mainstream” (MCCLOUD, 2005, p. 142 apud JENKINS et al, 2015, p. 330). 

As histórias em quadrinhos se caracterizam como um gênero gráfico e textual que levam narrativas por meio de desenhos dispostos em blocos e sequências. Enquanto fanarts não se concentram em extensas narrativas, sendo na maioria das vezes, cenas canônicas ou reinterpretações desejadas pelos fãs e autor. Um grande número desses artistas começa a ganhar reconhecimento através de fanarts e costuma conquistar o público específico ao qual consome da mesma ideia — leva-se em conta que a estética adquirida pelo artista também se torna um importante atrativo da obra. 

Diferente das publicações físicas — as comic books — os quadrinhos digitais rompem o domínio que a distribuição direcionada tem sobre o mundo dos quadrinhos (MCCLOUD, 2005). Segundo o próprio autor, essa observação corrobora com a amplitude de seu público de nicho e, ainda, contribui com a diversificação do público leitor da própria mídia (HQs). Por esses motivos, as webcomics acabam por prosperar em comunidades diferentes que enxergam alguma forma de afeto às narrativas (seja emocional ou ainda, ideológico). 

Como previamente discutido, na mídia independente, muitos criadores de conteúdos recorrem ao financiamento coletivo e para uma manutenção consolidada, dependem de uma rede de fãs. Como relata o gerente de programas da Microsoft, Geoffrey Long (2000), “[…] os webcomics são normalmente de propriedade e operados por seus criadores e dependem das receitas geradas por propagandas, assinaturas/filiação de fãs ou vendas de produtos acessórios”. A venda de produtos acessórios, commissions e cards ilustrativos (de fanarts ou de material original) é muito comum nos perfis das redes sociais dos artistas ou em sites exclusivamente para a venda do material. 

Entre diversos blogs, sites e plataformas que as webcomics e fanarts se destacam, estão o Tumblr, blogs e sites pessoais e profissionais, plataformas que auxiliam a migração para essas fontes. Para além delas, assim como as fanfics demandaram um espaço próprio para suas postagens (AO3, Wattpad, Nyah!), surgem plataformas específicas para as webcomics com o mesmo objetivo das obras, como o site Tapas. Apesar disso, as disseminações e portas de migração para esses veículos se concentram principalmente nas redes sociais dos autores. 

O Twitter se apresenta como uma rede social fluída e muito disso se deve a sua arquitetura informacional e operacional, que permite maior circulação entre interagentes e a construção de linhas cognitivas de um pensamento ou mídias (SANTAELLA; LEMOS, 2010). 

Com uma rede social que permite que você interaja e se esbarre com conteúdos que não são parte do meio social de seu convívio, norteado pelo interesse em assuntos e dados de busca e acesso dos interagentes, o Twitter se torna um veículo convergente entre conteúdo e público. Contextualizado, a percepção de como as obras se disseminam através da rede social é clara, mas vai muito além ao perceber o Twitter como um canal primário das veiculações de conteúdo, ao invés de portas de migrações para o objeto principal. 

Dois universos, diferentes regras e uma mesma realidade 

Arlindo e @ilustralu: 

Nascida no Rio Grande do Norte, Luiza de Souza é uma ilustradora que trabalha, principalmente, com freelas e seus projetos pessoais. A rede de disseminação de sua principal obra, Arlindo (2019 – presente), acontece principalmente no twitter. 

Na rede social, onde é conhecida pelo user @ilustralu, Luiza reúne mais de 24 mil seguidores. A webcomic em questão começou a ser publicada no Twitter em janeiro de 2019 e é postada semanalmente em páginas. No momento conta com um total de 112 páginas e é dividida em 2 partes – disponíveis no post fixado do perfil do twitter de Luiza. No período de quarentena devido à pandemia do COVID-19, a ilustradora passou a postar duas vezes por semana, às terças no horário de 20h, e às quintas no horário de 12h. Cada página gera cerca de 1,7 mil a 2 mil curtidas, enquanto as interações de retweets variam nas casas das centenas. 

Arlindo acompanha o cotidiano e conflitos interiores de um adolescente LGBT+ no interior do Rio Grande do Norte, enfrentando e abordando questões sociais como homofobia nos ambientes familiares e na sociedade, o primeiro amor e amizade. Os quadrinhos carregam cores vibrantes que se destacam na estética e na associação de suas ilustrações, com as cores predominantes rosa e amarelo. A história cativante conseguiu engajar o afeto emocional e social do público — que muitas vezes se sentiram tocados ou se identificaram na história, como sugere os relatos nos comentários das postagens. Muito se deve pela sua retratação cultural e regional, temáticas sociais LGBT+ e experiências da vida e objetos de gatilhos nostálgicos como o uso de lan-houses, MSN, Sandy e Junior entre outras referências musicais e da vivência juvenil dos anos 2000. 

Figura 5 - Fragmento da página 009, de Arlindo, por @ilustralu 

Como parte de uma interação com os leitores, na trama de Arlindo, Luiza convida os fãs a ilustrarem suas fantasias em uma festa temática dentro da trama. Formando uma grande rede de engajamentos, a ilustradora acaba decidindo selecionar alguma dessas artes de fãs para integrar como convidados da festa na história. 

Figura 6 - Convite com ilustração de fã e fragmento da página 105 de Arlindo, por @ilustralu 

Apesar de disponibilizar gratuitamente as páginas a artista também faz um apelo para que os leitores possam contribuir financeiramente através do Catarse. Adotando um sistema de assinatura mensal e com recompensas de conteúdos que se diversificam para diferentes valores. Sendo assim, quem contribui com a assinatura mensal, é recompensado com diversos conteúdos extras, como spin-offs da webcomic e outros trabalhos da ilustradora. 

Figura 7 – Captura de tela de tweet anunciando a assinatura mensal do projeto no Catarse (Acesso: 23/05/2020) 

Para o valor de cinco reais ou mais por mês, a ilustradora libera extras através do newsletter semanal que conta com o processo de criação da webcomic, a partir de dez reais, o assinante recebe o newsletter e pôsteres mensais liberados para impressão (exceto para uso comercial) e para além de vinte reais, o fã recebe todas as outras recompensas, uma série de dicas para quem trabalha na área ou tem interesse de começar, outros quadrinhos digitais já publicados por Luiza. 

Figura 8 – Captura de tela da página do projeto de Luiza de Souza no Catarse e recompensas da assinatura mensal (Acesso: 23/05/2020) 

Oséias e @mejohncito 

Johnatan Marques é autor e ilustrador, tendo em suas obras já publicadas a webcomic interativa Oséias (2019 – presente), os contos Se tudo der errado amanhã (2018), Toda Magia (2020) e a participação na antologia História (mais ou menos) assustadoras (Editora Magh, 2019). Também utiliza do Instagram como meio de publicar artes diversificadas e originadas da webcomic (@meusolhossaocastanhos). A HQ é publicada na plataforma Tapas, entretanto o twitter é uma rede fundamental para a narrativa. 

No Twitter, o autor reúne 4.471 seguidores. O quadrinho digital começou a ser publicado no dia 27 de fevereiro de 2019 e também é postado semanalmente, com hiatos que separam uma parte da outra. No momento o gibi reúne 048 e é dividido em 3 partes. Seu número de engajamento é irregular, apresentando espaço de variações muito grande, mas se concentram principalmente na casa das centenas. 

Figura 9 - Capa da primeira página do gibi virtual Oséias, de Johnatan Marques 

A história acompanha a vida de Os (Oséias). Um mago lobisomem com poderes de clarividência. Durante a trajetória do gibi, temas como racismo, relacionamento homoafetivo, família e legado são abordados, acompanhado de uma ampla diversidade étnica dos personagens. 

“Oséias Caetano passaria batido como um jovem paulistano qualquer se não fosse o fato de que ele é um licantropo capaz de prever o futuro. Às vésperas de ingressar em sua vida acadêmica, Os precisa decidir se seguirá seus sonhos ou trabalhará no negócio da família” (CATARSE, 2019, Online). 

O gibi conseguiu uma rede de fãs através da representatividade e da história de afeto narrada. Que segundo o próprio autor, surgiu da necessidade de ver sua realidade representada nas mídias e com elementos que fosse de seu gosto, como a fantasia urbana (CATARSE, 2019, Online). 

Figura 10 - Fragmento da página 030 de Oséias, por Johnatan Marques 

Na plataforma Tapas, a webcomic é, ainda, acompanhada de intermídias que ajudam a compor a narrativa, como a possibilidade de ouvir trechos de músicas no próprio aplicativo, referente à página. Todavia, é no Twitter onde a história acontece coletivamente através da interatividade dos fãs. Acompanhado da página, o autor publica uma enquete com possíveis desdobramentos a partir da última página. 

Figura 11 - Captura de tela da thread de publicação do gibi Oséias, com enquete interativa da história. (Acesso: 23/05/2020) 

Apesar da publicação gratuita nas redes sociais e plataforma, o autor recorreu a publicação física devido a demanda do público leitor. A impressão aconteceu através de financiamento coletivo no Catarse, obtendo cerca de 256 apoiadores, atingindo 150% da meta. O autor definiu oito formas de recompensas dividido em “packs” temáticos. Os valores variam de dez a cento e cinquenta reais, com recompensas que diversificam de versões digitais do gibi que continha páginas exclusivas, a versão autografada, e prints, pins e outras recompensas. 

Figura 12 - Captura de tela do projeto Oséias (2019) #1 no Catarse. (Acesso: 23/05/2020) 

Além do financiamento coletivo, o ilustrador também mantém um projeto de assinatura mensal de newsletter, na mesma plataforma. Como recompensas para a contribuição financeira, Johnatan também disponibiliza de conteúdos e páginas exclusivas dividida em 5 outras formas de recompensas, envolvendo newsletter mensal, prints para download e impressão, e envio de um pacote com carta escrita à mão. Os valores vão de cinco a vinte reais mensais, e alguns dos pacotes possuem limites de assinantes. Além das derivações que envolvem o universo de Oséias, como o spin-off “Poente”, o ilustrador também recompensa o contribuidor com outros trabalhos autorais e formas de serviços referente à área. Destaca-se que, as diversas formas de contribuição financeira deslocam-se somente à afetividade do universo consumido, para a própria manutenção e cooperação do ilustrador enquanto profissional autônomo. 

Figura 13 - Capturas de tela de tuítes referente ao projeto de financiamento coletivo e atividade de freelance pelo integrante @mejohncito (Acesso: 29/05/2020) 

Mídias subvertidas e o engajamento gratuito 

No ambiente de convergência as demandas sociais e tecnológicas acontecem de forma paralela. Enquanto há necessidade de novos recursos tecnológicos motivados por interações sociais; essas tecnologias têm seus usos subvertidos pela experimentação e expressão do público. O espaço virtual permite que as relações sejam ressignificadas, redirecionando o consumo à uma produção ativa e constante — que não é desprevenida de crítica nem mesmo alienada. 

O engajamento nas mídias independentes não se caracteriza como um consumismo alienado porque fazem parte de uma troca de produções na qual existe o apoio mútuo de prosumers. O papel do multiplicador se ressalta na ajuda mútua entre os artistas na cultura das webcomics

Figura 14 - Capturas de tela de tuítes no qual @ilustralu e @mejohncito apoiam a webcomic “A Vida de Nina” da ilustradora @danifranck, através de ilustração de personagens. (Acesso: 29/05/2020) 

Jenkins et al (2015, p. 195) afirmam que “O modelo de engajamento sugere que ter alguma coisa para fazer também dá aos fãs algo sobre o que falar e os incentiva a propagar conteúdos para outros membros potenciais de público”, mas isso apenas acontece porque é derivado de uma atividade espontânea. O trabalho gratuito do fã é, com frequência, reduzido a um trabalho alienado a partir da concepção de modelos econômicos clássicos na qual a principal motivação é o retorno financeiro. No entanto, o termo engajamento se ressignifica para as comunidades de fãs que estão em busca de seu próprio interesse (JENKINS et al, 2015). 

Contudo, é necessário separar dois pólos, nas quais se enquadram a mídia massiva no poder de comunicação ao fã, e a mídia independente com pretensão de alcançar o público nicho. Colocá-los no mesmo patamar é desconsiderar diferentes classes produtivas, alcance de público e ideologia de valores. Seja ao produzir uma história pela simples motivação de gerar lucro, ou forma expressiva de entretenimento e pensamentos críticos do pequeno produtor. 

O ponto de convergência entre as duas balanças é o poder e o valor do fã e de seu engajamento em fenômenos como as fan-criações, binge watch, social tv, e engajamento transmídia. “A discussão sobre “engajamento” se encaixa no discurso do setor que tem procurado novas maneiras de formular, medir e rentabilizar o que as audiências fazem com o conteúdo dentro da cultura de rede” (JENKINS et al, 2015, p. 97). Todavia, a cultura de fãs é um fenômeno natural de reação ora coletiva, ora individual, e possui diferentes impactos sobre uma produção. 

Referências

JAMISON, A. Fic - Por que a fanfiction está dominando o mundo. São Paulo: Rocco, 2017. 

JENKINS, H. et al. Cultura da conexão: criando valor e significado por meio da mídia propagável. São Paulo: Aleph, 2015. 

MARTINS, N; DA SILVA, P. Funcionalidade dos sistemas financeiros e o financiamento a pequenas e médias empresas: o caso do crowdfunding. Revista Economia Ensaios. v. 29, p., 2014. Disponível em: <https://bit.ly/2AqaDsm>. Acesso em: 13 jun. 2020. 

MCCLOUD, S. Reinventando o quadrinho: como a imaginação e a tecnologia vem revolucionando essa forma de arte. São Paulo: M. Books, 2005. 

MCCRACKEN, G. “Consumer” or “Multipliers”?. Spreadable Media, Online, 2013. Disponível em <http://spreadablemedia.org/essays/mccracken/index.html#.XtgHMpNKhPZ> Acesso em: 17 de mai. 2020. 

SANTAELLA, L; LEMOS, R. Redes sociais digitais: a cognição conectiva do Twitter. São Paulo: Paulus, 2010. 

STRIBLING, E. Valuing Fans. Spreadable Media, Online, 2013. Disponível em <http://spreadablemedia.org/essays/stribling/index.html#.Xtga3pNKhPZ>. Acesso em: 17 de mai. 2020. 


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